O que é ZEN?



Fonte: O Livro de Ouro do Zen - A Sabedoria Milenar. David Scott; Tony Doubleday.

"Iluminação significa ver através da sua própria natureza essencial e isto, ao mesmo tempo, significa ver através da natureza essencial do cosmos e de todas as coisas. Pois, ver através da natureza essencial é a janela da iluminação. Podemos chamar a natureza essencial de verdade, se assim quisermos. No Budismo dos tempos antigos, foi chamada de talidade, ou natureza de Buda ou a mente.  No Zen, tem sido chamada de não-existência, a mão, a face original de alguém. As designações podem ser diferentes, mas o conteúdo é absolutamente o mesmo."

MESTRE ZEN ROSHI HAKUUN YASUTANI (1885-1973)

Zen é o método prático de realização dessa natureza de Buda. É uma disciplina  do corpo e da mente que exige grande esforço, perseverança e fé, tanto na possibilidade da Iluminação como na sua própria capacidade de alcançá-la. E simples, direto, prático e  ocupa-se  do  aqui  e  agora.  

O mestre Zen Umon (morto em 949), quando perguntado como agir de acordo com a verdadeira natureza, respondeu:

Quando andar, apenas ande, Quando sentar, apenas sente; Acima de tudo, não vacile.

Como Umon tão claramente demonstrou, a essência do Zen é transmitida mais diretamente através da linguagem da experiência diária e não com frases acadêmicas ou teológicas. O objetivo pragmático do Zen é levar o praticante a uma experiência direta da vida em si. Eliminar todas as distinções dualísticas como eu/você, verdadeiro/falso, sujeito/objeto, a fim de chegar a uma consciência da vida não condicionada por palavras e conceitos.

Obviamente, precisamos das palavras para comunicar as ideias, mas a visão do Zen é que, se confiarmos somente nelas, corremos o risco de substituir o conhecimento a respeito de alguma coisa pelo esforço de empenhar-se para ter uma experiência direta da sua realidade. O método Zen destina-se a demonstrar a Realidade, e não a descrevê‑la por meio de palavras. Portanto, os métodos de treinamento do Zen são programados, algumas vezes de forma  bastante rude, a fim de proporcionar ao praticante uma experiência direta da Realidade sem véus, sem enfeites.

Pergunte ao um mestre Zen: "O que é o Zen?", e ele é bem capaz de responder com outra pergunta do tipo: "Quem você é?" ou "O que é a vida?". A partir da sua perspectiva, o Zen é, antes de tudo, a experiência que o discípulo deve identificar em sua própria vida. O mestre vai dizer que livros e palestras podem transmitir uma certa instrução e interpretação úteis, porém constantemente salientará as suas limitações. As informações são adquiridas e passadas de uma pessoa para outra, ao contrário da experiência do Zen, que se preocupa com a natureza do nosso ser interior. Desde que estejamos satisfeitos por perseguirmos um mero conhecimento do Zen, podemos nos tornar acadêmicos brilhantes, mas deixaremos de confrontar a nossa existência como seres humanos e, consequentemente, não vamos entender o Zen. 

Segundo um mestre Zen  chinês, Mumon (1183-1260):

"Ao  nos  empenharmos  em  interpretar claramente, retardamos a sua realização."

A palavra Zen é uma abreviatura de Zenna ou Zenno, que é a maneira de os japoneses lerem os caracteres chineses do Ch'anna, que, por sua vez, quer dizer dhyana, em chinês. Esta é uma palavra sânscrita que descreve o ato da meditação e o estado de consciência não‑dualística (ou outros estados de consciência fora da experiência cotidiana), que podem surgir com a prática.

Como se pode deduzir das origens de seu nome, o fundamento da prática do Zen é a meditação Zazen, e seu objetivo específico é levar o praticante a uma completa realização da sua verdadeira natureza. O Zen ensina que a prática do Zazen é o caminho mais íngreme, porém mais rápido, para a Iluminação ou para "ver as coisas como elas são". A meta do Zen é a Iluminação, e uma Iluminação sempre aprofundada.

Os ensinamentos do Zen dizem que devemos deixar de lado a dialética sobre o que é a Iluminação e, sim, apresentar sua manifestação na vida diária. Portanto, a maneira de praticar o Zen não é ter uma compreensão conceituai daquilo,  por  exemplo,  que  o Roshi Yasutani (na citação que abre este capítulo) chama de natureza essencial e, depois,  sair  procurando-a.  Ao  contrário, temos de nos tornar conscientes de nós mesmos como realmente somos e saber avaliar o que significa o autoconhecimento consciente. Raramente paramos para pensar o que realmente significa dizer: "Eu penso" ou "Eu sinto", ou "Eu faço" e, entretanto, refletir sobre isso é o primeiro passo para a Iluminação.

O mestre Soto Zen Roshi Kodo Sawaki disse que praticar o Zen é se tornar íntimo do Self (Eu). O Self (Eu) é aquela enorme dimensão da existência a que chamamos de Natureza Essencial. Inclui e não se opõe ao ego, com o qual normalmente nos identificamos e a partir do qual criamos a persona que mostramos para os outros. O Zen não quer, como alguns pensam, destruir ou livrar‑se do ego, como se este fosse uma parte física de nós mesmos que pudesse ser cirurgicamente removida. O ego é a soma total de todas as nossas lembranças, hábitos, desejos, aversões, opiniões, padrões de pensamento etc. Ele oferece nossos pontos de referência para nos relacionarmos no mundo e, nesse contexto, é um instrumento vital. Entretanto, também nos restringe e nos frustra quando não entendemos sua perspectiva provisória e limitada sobre a vida. Acima de tudo, ele é impermanente e sem substância e, portanto, faz parte de uma consciência ou vazio  maior. Ao dar-se conta da ligação íntima com o Self, o ego é transcendido, perde sua sujeição e pode ser usado livremente, compassivamente e com sabedoria.

Concluindo, podemos dizer que o Zen é universal e apropriado para qualquer pessoa, em qualquer lugar. Uma de suas crenças básicas é que a natureza de Buda é inerente a todas as pessoas e que ela é perfeita. Este  verdadeiro  Self possui compaixão e amor  pelos seus semelhantes, mas, como disse Buda, "devido à mente do homem ter se tornado invertida, através do pensamento ilusório, ele deixa de percebê‑lo". O discípulo do Zen aspira enxergar através da ilusão e para dentro do seu verdadeiro Self e, dessa forma, a natureza de toda a existência. Assim sendo, o treinamento Zen não acrescenta nada ao indivíduo; pelo contrário, mostra o caminho para extirpar as ilusões, a fim de que se torne o que realmente é, para voltar para casa, na linguagem do Zen. Este voltar para casa implica ver as coisas cada vez mais verdadeiramente, como elas são na realidade.

A filosofia Zen baseia-se em suposições que não podem ser provadas por meio de argumentos intelectuais. A única maneira de realmente entender o Zen é através do conhecimento experimental. Este é obtido na tradição Zen, através dos métodos de treinamento desenvolvidos, desde o tempo de Bodhidharma, há 1500 anos.

O treinamento ideal do Zen implica a prática regular do Zazen, ser membro de uma comunidade ou associação Budista (Sangha), ter acesso direto aos ensinamentos de um guia espiritual (um Roshi) e estudar os ensinamentos de Buda (o Dharma). Buda, o Dharma e o Sangha são conhecidos como os Três Tesouros.

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